sábado, 28 de março de 2009

Ao longo do Arno, embaixo das cobertas

Hoje resolvi caminhar no sentido oposto ao centro, na direção da área residencial onde ficarei hospedado a partir de amanhã. É uma área que está nos limites do mapa que recebi na recepção da pensão, então não me surpreendi quando me perdi. Quando percebi que havia me perdido, eu estava numa praça não indicada no mapa, e havia uma quadra onde alguns meninos, e uma menina, jogavam futebol. Eram muitos meninos para uma só quadra, e a cena me trouxe uma lembrança antiga de colégio, minha primeira aula de educação física no 7 de Setembro. Como recreação, o professor Pires jogou uma bola no meio da quadra e todos nós, com 7 ou 8 anos de idade, corríamos atrás da bola. Não havia organização nenhuma: apenas um monte de meninos querendo dar um chute que fosse numa bola. Foi mais ou menos isso que eu vi hoje, na Piazza Torquato Tasso.



Já que estava perdido mesmo, resolvi vagabundear um pouco por alguns minutos. Fiquei pensando que talvez os italianos não tenham uma palavra que seja equivalente a "paralelo". Mas lembrei de que há excelentes matemáticos italianos, então concluí que os italianos apenas não aplicaram o conceito de paralelismo às ruas, que são curvilíneas e labirínticas. Quando me cansei da vista, tomei o rumo do rio, o Arno, que corta a cidade de Florença. Quando cheguei na beira-rio, vi uma mulher correndo e subi uma escadinha para ter acesso à pista de corrida e caminhada: uma linda visão.

Um pouco mais adiante, nessa mesma pista, havia um parquinho para crianças. Os brinquedos já tinham me impressionado na praça Torquato Tasso, mas só agora resolvi fotografar. Em Roma eu já tinha observado que as coisas são mais estilizadas, quase tudo recebe um toque estético, a coisa não é apenas a coisa, é a coisa preparada para o encanto. Bem interessante também é o chão que, na foto, aparece em cinza escuro ou em vermelho. Quando pisei nele, tomei um susto: é um chão com amortecimento, e a gente sente uma maciez deliciosa a cada passo.

Quando acabou a área de caminhada e do parquinho, resolvi dar uma entrada numa rua sem saída só pra fotografar uma parede de cartazes. É muito comum aqui, em Firenze, a divulgação de eventos culturais por meio desses grandes cartazes. Fotografei vários deles pra depois conferir exatamente os horários e os locais das exposições e dos shows.

Logo em seguida, eu me encontrava na rua que margeia o rio Arno e que recebe nomes diferentes de quarteirões em quarteirões, mas sempre começando com Long'Arno ou Longarno, ao longo do Arno. Eles fizeram uma espécie de barragem para a pescaria, que acaba servindo como praia para algumas pessoas, como aparece aí na foto: o pescador esperando que o peixe fisgue o anzol, e o casal deitado conversando.

Tive que mudar de calçada pra olhar de perto uma vitrine que me chamou a atenção. É impressionante a quantidade de pequenas galerias de arte em Florença. Essa exibia uma pinturas em manequins de plástico. Linda a combinação de cores. O artista chama-se Giuliano Ghelli. Havia o anúncio de uma exposição chamada "Le porte della fantasia", que eu não deixarei de visitar durante a semana.

Do outro lado do rio, me chamaram a atenção essas janelas que formam um portal tanto quando estão fechadas como quando estão abertas. Fiquei pensando na possível transposição disso para um livro, lembrando dos formatos diferentes de livro que vi na Feira de Bologna.

Em Florença, o rio Arno é cortado por várias pontes, sendo a Ponte Vecchio a mais famosa. Quando eu cheguei na ponte imediatamente antes dela, dei uma entrada e pedi a um casal para tirar uma foto minha com ela ao fundo. É curiosa essa ponte porque tem construções em cima. Eu suponha que deveriam ser lojas de bugingangas para turistas, mas, logo em seguida, vi que estava enganado.

A rua à beira-rio era interrompida na altura dessa ponte em que tirei a foto. Pra me aproximar da Ponte Vecchio, tive que pegar uma rua paralela, ou razoavelmente paralela, já que o paralelismo das ruas, como já falei, não parece ser uma preocupação para os italianos. Essa rua combinava construções antigas com edifícios mais modernos, como esses aí da foto: uma bonita combinação.

Na mesma esquina desses prédios, havia uma papelaria, coisa também muito comum em Firenze. Mas não são essas papelariazinhas escolares, não. São papelarias cheias de objetos feitos para atrair nosso olhar e tentar nosso tato. Como já passava de 13h, a papelaria estava fechada, mas tirei uma foto desse marcador de livros com uma frase de Leonardo da Vinci que me fez lembrar de Vó Isolda: "O gênio é paciência."

Antes de chegar na Ponte Vecchio, resolvi dar uma parada para almoçar. E parei no lugar certo, porque comi o melhor nhoque da minha vida: um gnocchi quattro formaggi que ainda está derretendo na minha boca. Ainda pensei em esperar para comê-lo amanhã, que é o dia certo do mês pra comer nhoque, mas fiz bem em antecipar: delícia, delícia, delícia.

Enfim Ponte Vecchio. Sabe de que são as lojinhas sobre a ponte? Joalherias. Quem diria? Se um dia aquela ponte cair, uma pequena fortuna irá long'arno. É tanto brilho, é tanto ouro que até ofusca a vista. Incrível o contraste do burburinho da ponte com a área residencial em que eu estava alguns minutos antes: parecia outra cidade.

No meio da ponte, tem uma estátua. Na cabeça da estátua, tem um pombo. Os pombos são um capítulo à parte em toda a Itália. Eles se sentem os donos do pedaço. Ao invés de fugirem dos humanos, ou ficarem mendigando migalhas de pão, eles levantam voo e aterrissam na nossa frente, tirando fino e quase esbarrando na gente.

Ao redor da estátua tem uma grade com uma plaquinha dizendo que é vietato (ou seja, proibido) colocar cadeados nos ferros. Cadeados?! Quem teria uma ideia maluca dessas? Pelo jeito, muita gente, ou pelo menos muitos casais de namorados que escrevem seus nomes nos cadeados e os prendem às grades de ferro. Deve ser uma forma de garantir a segurança do relacionamento, ou algo assim.

Atravessando a ponte e caminhando um pouco no sentido do Arno, eis a Galeria Uffizi. Dentro tem obra de arte que nem presta, mas hoje resolvi apenas dar uma passada de reconhecimento externo. No pátio, muitos pintores vendendo suas aquarelas ou se dispondo a retratar turistas. Essa foto aí, tirada do pátio, mostra uma outra coisa que tenho visto bastante na Itália: guindastes. Em Roma, em Bologna, em Firenze, há sempre vários guindastes. Parece que o país todo está em construção.

Mas o que mais me chamou a atenção no pátio da Galeria Uffizi, na verdade nas escadarias, foi um homem vestido de cupido que brincava, aos beijos e abraços, com as pessoas que lhe davam alguns trocados. Infelizmente não consegui gravar uma cena hilária que aconteceu logo que cheguei em frente a ele, mas essa aí dá uma idéia da diversão. Na cena que não gravei, o marido filmava a esposa abraçada com o cupido e, ao final da performance, o marido se aproximava e... tascava um beijo na boca do cupido. Depois puxava a esposa pela mão e saíam correndo: o marido com a boca e o nariz completamente brancos de tinta de maquiagem.



No final do pátio da Uffizi, na entrada da Piazza della Signoria, fiz uma panorâmica de 360º com as atrações do lugar: um violonista, os artistas performáticos (o cupido bem ao fundo), as estátuas e o... limpador de ruas. Fiquei encantado por esse limpador desde a primeira vez que o vi, na estação Termini, em Roma. Eu sempre achei muito inglório o trabalho dos garis e dos lavadores de chão, limpando enquanto as pessoas já estão sujando novamente. Esse carrinho aí é uma maravilha.



Estou impressionado com o resultado fotográfico e videográfico do dia. Caminhei só umas quatro horinhas e vi isso tudo! Parecia que eu estava adivinhando que no final da tarde começaria a chover e que toda minha vontade -- plenamente realizada -- seria ficar na cama, embaixo das cobertas, cochilando, lendo, escrevendo e vendo TV.

Quanto a amanhã, um pouquinho de ansiedade: dia de mudança. Sairei do hotel e irei para uma casa de família, onde permanecerei por quatro semanas, enquanto faço um curso de italiano no período da manhã. Sem contar que nessa madrugada começa o horário de verão -- embora o tempo não esteja nem pra primavera -- e eu terei uma hora do meu dia roubada -- não será nem emprestada, já que em setembro ou outubro, quando a hora for devolvida aos italianos, eu não estarei mais aqui.

8 comentários:

  1. Sempre achei que você iria adorar Florença e que nós corremos um belo risco de você querer morar por aí. rsrsrsrs. Grande beijo. Aproveite esta bela e acolhedora cidade. Karina

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  2. Edu, eu e Tess estamos acompanhando e adorando sua aventura. Estamos com saudade e loucas pelo reencontro. A bb quer saber se já tem uma namoradinha italiana... bjim...

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  3. O melhor de "viajar" com você, é que, além dos lugares que conhecemos, podemos partilhar dos seus sentimentos e idéias com relação a cada coisa.
    Boa acolhida na nova estadia :o)
    Tia Monca

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  4. Junoca, belas fotos e boas emocoes. Mesmo tendo se perdido, voce aproveitou bem o caminho que fez. Boa mudanca e bom inicio de estada com essa familia que vai acolhe-lo. Beijo

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  5. Estou aqui, viajando junto. Você comeu nhoque um dia antes do nosso dia brasileiro para atrair fortuna, que é sempre o 29 de cada mês, mas tbem, quem precisa de mais fortuna quando "a coisa não é apenas a coisa, é a coisa preparada para o encanto." :)
    beijo aventureiro, procê!

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  6. Júnior, adorei os vídeos. O cupido é muito engraçadinho :)
    Fiquei com água na boca do nhoque !!!
    Beijos e Saudades
    Sabrina

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  7. Maninha, não tem como eu vir morar aqui, a não ser que Florença arranje um mar. :)

    Tarci, grato pela companhia. Avisa à Tess que minha namorada está me esperando no Brasil. :)

    Sim, Tia, que este diário esteja compensando um pouco as longas conversas que não temos há tempo. :)

    Ceíta, a nova casa está ótima. Você também está bem acomodada? :)

    Claudia, comi outro nhoque hoje. Delicioso. :)

    Biba, vou ver se volto lá e faço mais vídeos do cupido, porque ele é realmente maravilhoso. :)

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  8. Sim Junoca, estou muito bem acomodada. E procurando melhorar.

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