segunda-feira, 30 de março de 2009

Sim senhora, professora

Ontem, logo que fechei o notebook, o bloco de desenho e o lápis, juntos, ao mesmo tempo, exclamaram:

-- Allora? Vai ficar só no blablablá ou vai desenhar alguma coisa?

Foi o jeito eu arriscar uns traços. Nada impressionante, como vocês podem ver aí ao lado, embora eu achei que me sairia pior. Creio que o mérito é do papel, do lápis e borracha florentinos. Primeiro me vieram à mente os guarda-chuvas, depois as borboletas. Então resolvi desenhar olhando para algo, no caso um adesivo que peguei na feira de Bologna e que colei na tampa de meu notebook.

Depois fui tomar um banho. Aliás, existe uma coisa comum em todos os lugares que já passei: o chuveiro-ducha, se é que posso chamá-lo assim. É uma ducha grande que, quando fixada numa espécie de coluna, vira um chuveiro; ou, dizendo de uma outra forma, é um chuveiro destacável que, quando tirado, se transforma numa ducha. Eu, particularmente, gostei da idéia. Alguém sabe se isso está disponível no Brasil?

Depois do banho, cama. Com Pinocchio. Interessante que, na minha lembrança, Pinóquio era uma historinha curta sobre um boneco de pau que gostava de mentir. Mas que nada! É uma história longuíssima, e Pinocchio passa por um tanto de coisa, mete-se em todo tipo de situação, fala com os bichos... O boneco apronta tanto que às vezes chego a sentir raiva dele. Mas é uma história interessante. E poder começar a ler em mais uma língua, agora italiano, é realmente maravilhoso.

Dormi com frio, aquecido pelas cobertas, mas acordei de madrugada com uma sensação que fiquei na dúvida se poderia chamar de calor. Era uma espécie de ardência. Até fiquei pensando se era algum tipo de doença ou alergia, mas dormi logo em seguida. Quando acordei, estava bem, então deve ter sido só o calorzinho das cobertas e do aquecedor, embora Bigi tenha me dito, pela manhã, que o aquecedor é automaticamente desligado entre uma e cinco da manhã: “porque um pouco de frio faz bem pro sono”.

Antes de passar adiante, preciso falar um pouco mais de uma das cobertas, porque as mulheres me perseguem surpreendente e maravilhosamente. Não, eu não recebi a visita de ninguém no meu quarto à noite, visto que ele estava fechado à chave. Falo da própria coberta, que tem várias vezes o símbolo de Vênus, a Deusa do Amor, gravado na borda, e, ao lado de cada símbolo, a palavra “mulher” escrita num idioma diferente. Dormi me sentindo abraçado por mulheres do mundo todo.

Conforme combinado, Bigi havia preparado o café às 8h. (Ela, na verdade, me disse que prefere que eu a chame pelo sobrenome, mas aqui, no diário, continuarei chamando-a pelo primeiro nome, até pra melhor garantir sua privacidade.) Quanto ao café, era simples e bom: caffelatte, pão em torradas, burro (manteiga, gente!), geléia, ricota. Terminei o café às 8h25 e não tive tempo calmo suficiente para fazer meu cocozinho, que talvez tenha que mudar de horário para a tarde ou a noite.

Peguei o ônibus 6, cheio quase lotado. Fazia uns 20 aos que eu não pegava um ônibus para ir à escola. Tudo bem, em Teresina eu pegava ônibus para ir à universidade. Mas eu era professor-pesquisador, e não aluno. De todo modo, pegar ônibus cheio me fez pensar em ir caminhando para a escola, que deve levar no máximo meia hora.

No Istituto Italiano, a alegre redescoberta do sentido de uma palavra comum, corriqueira, ordinária: “secretaria”. Nunca havia me ocorrido nada de especial sobre a palavra “secretaria”, mas quando vi no Istituto uma placa com a indicação “segreteria”, eu sorri de alegria por descobrir o segredo daquela palavra. Quer dizer, então, que secretaria é um lugar de segredos? E, por consequência, que a secretária é uma repositória de segredos, uma espécie de confidente? Que coisa maravilhosa! Esse é um dos grandes benefícios de aprender outras línguas: a similaridade com algumas das palavras de nossa própria língua faz com que descubramos significados ocultos naquilo que falamos no dia-a-dia.

Ia tudo bem, no Istituto, quando a minha confidente, a secretária, Giuliana, perguntou se eu queria entrar no nível 1 ou se preferia fazer o teste. Bom, se eu estava entendendo o que ela estava dizendo, poderia pelo menos arriscar o teste. Quando entrei na sala, já tinha um monte de aluno escrevendo, o que me levou a pensar que cheguei atrasado. Como não estou usando celular, e como há muito tempo não tenho relógio, o tempo aqui na Itália, pra mim, tem sido uma coisa meio inexata. Pois foi só eu tirar o casaco e o cachecol, e começar a fazer a prova, pra perceber que eu deveria ter estudado um pouquinho mais de italiano antes de chegar aqui. Claro que eu havia me preparado. Eu tinha visto filmes e programas de TV, tinha ouvido discos e rádios,tinha lido artigos e textos, tinha até mudado o idioma de meu e-mail para o italiano, mas não tinha me dado ao trabalho de decorar umas conjugações verbais. E era basicamente disso que se tratava a prova, a qual deixei em branco pelo menos pela metade quando a entreguei.

Alguns minutos depois, na mesma sala, diante de todos, a professora me chamou para o teste oral. Na verdade, ela chamou “Eduardo, de Brasile” e, enquanto eu caminhava do fundo da sala até a mesa da professora, um outro homem sentou na cadeira em frente a ela. Eu disse “Anch’io sono Eduardo di Brasile”, “eu também sou Eduardo, do Brasil”. Ela então mostrou a prova para que reconhecêssemos a letra. Era minha. Saudei meu xará, ele se levantou e eu me sentei. No teste oral, devo ter me saído um pouco melhor do que no teste escrito porque a professora, incrivelmente simpática, disse que ia me colocar no nível 2. Claro que ela, olhando novamente a prova e tirando um pouco a simpatia da cara, completou: mas você vai ter que estudar! “Sim senhora, professora”. E assim eu me vi de volta aos bancos escolares.

Quando todos terminamos o teste, os diretores do Istituto, um casal, falaram sobre a escola e sobre o dia-a-dia em Florença. Ele falaram por pouco mais de uma hora e o mais impressionante é que, até onde posso avaliar, eu entendi tudo o que eles disseram. E eles explicaram tão bem que nenhum de nós, a maioria vindo a Florença pela primeira vez, fez uma pergunta sequer. Mentira, um homem que estava sentado atrás de mim perguntou como se fazia para alugar uma bicicleta. A única pergunta que eu queria fazer já me fora respondida durante a exposição: “quem tivesse laptop, poderia trazê-lo e usufruir da conexão gratuita sem fio, de uma às seis da tarde,desde que usasse apenas a bateria do laptop, sem ligá-lo na tomada”. Será que a energia aqui é mais cara do que a conexão? Bom, isso não importa muito. É suficiente saber que terei umas duas horas de internet por tarde, de segunda a sexta-feira.

Isso me fez começar a conceber minha rotina nas próximas quatro semanas: acordar às 7h30, fazer a higiene matinal, tomar café às 8h, sair para a escola às 8h30, assistir aulas de 9 a 13h, almoçar perto da escola (ah, que delícia cada coisa que tenho almoçado), voltar por volta de 14h30 para acessar a internet, retornar para casa. Em alguns dias, posso ficar na escola para a programação cultural das 16h (estou particularmente interessado nos filmes), em outros dias posso guardar a energia para ir à noite ao teatro (estou pensando em comprar o PASSTEATRI, um passe que dá direito a assistir seis espetáculos por um preço reduzido).

Almocei num dos restaurantes indicados pela escola, que ficava a umas três quadras de distância. A comida, um Lunghini alla Pescara, estava deliciosa. O preço era até bom, 7 euros (não converta, não converta, não converta), mas me cobraram uma espécie de 10%, o coperto, que na verdade era uns 30%, 2 euros. Acho que, a partir de amanhã, vou comer lá onde comi as borboletas: gostoso, ainda um pouco mais barato e vizinho à escola. Embora seja difícil resistir a experimentar novos restaurantes ou então cair na dieta bolognesa de vez em quando: pizza, pizza, pizza.

Às duas, estava de volta ao Istituto porque haveria um passeio guiado pela cidade. Pensei que ia ser uma coisa rápida, só situando a gente, mas desconfiei de que seria algo diferente quando a guia falou que terminaria perto de 18h. Acompanhei o grupo, de todo modo. A guia ia parando nos prédios históricos e falando aquelas coisas que os guias falam. Cansei da brincadeira na terceira explanação, pedi licença e voltei caminhando pra casa. O fato de algumas lojas estarem fechadas, porque era o horário de pranzo, me lembrou de que eu também merecia um cochilo. Perto de casa, parei pra comprar água na loja de um imigrante em cujo país não se deve tirar cochilo depois do almoço, porque a loja estava abertíssima.

Em casa, fiz – graças a Deus – um cocozinho e tirei uma soneca de quatro às cinco. Comi um cioccolato, para tirar o amargo da boca, e peguei logo um livrinho de italiano para viagem e abri na página de gramática: “Sim senhora, professora, vou estudar”. Fiquei na cama, recitando verbos por mais de uma hora. Agora já tenho uma idéia melhor de como falar as coisas no presente, no passado e no futuro.

Com o fim da tarde, o frio começou a atacar e vim para o computador escrever o diário. Depois jantar, banho, desenho, Pinocchio, cama. Dormir cedo, acordar cedo, chegar à escola na hora, receber o material escolar e recomeçar, pra valer, minha vida de estudante. Pelo menos pelas próximas quatro semanas. Porque estudar cansa – isso não tenho como esquecer.

domingo, 29 de março de 2009

O dia em que comi borboletas

Botei o despertador para 8h30, ou seja, para 9h30, já que o horário de verão, aqui chamado de “ora legale”, entrou em vigor de madrugada. O engraçado é que, aqui, a mudança de horário não se dá à meia-noite, mas às duas da manhã. Será que esse mesmo horário, com duas horas de acréscimo, vale também para o retorno de Cinderela para casa?

Fiz um pequeno esforço para sair da coberta quentinha e me dirigi à sala de café da manhã, onde meu pratinho, com um carioquinhazinho (deve ser um terço do nosso carioquinha) e um croissant, já estava me esperando. Na pensão, não tem boca livre, não. Cristina preparou um cappuccino, peguei dois tabletes de burro, quer dizer, de manteiga, e pronto. O bom é que a gente não enche a pança como costuma fazer nos cafés da manhã dos hotéis mais chiques.

Cristina disse que eu não precisava sair exatamente às 10h30, conforme indicado nos cartazes, que eu poderia sair às 11h ou um pouco mais, e eu aproveitei esse tempo para dar uma entradinha na internet, responder uns e-mails e praticamente zerar a minha caixa de entrada. Não queria deixar nada pendente, pois eu não sabia se teria acesso na casa da senhora Bigi.

Saí do Tourist House, na Via della Scala nº 1, simples mas que recomendo a todos, de mala e cuia de cabeça pra baixo, ou seja, com um guarda-chuva. Desde ontem no final de tarde que chove em Firenze e, enfim, pude inaugurar meu guarda-chuva verde, embora tenha dado não mais que vinte passos debaixo dele, pois havia uma parada de táxi logo na rua transversal (lembrem-se de que, aqui, encontrar ruas paralelas ou perpendiculares é uma raridade). Todos os táxis que peguei até agora na Itália custaram entre 9 e 11 euros. Normalmente o que pago em Brasília. Não, não façam a conversão, eu já disse que “quem converte não se diverte” e, além do mais, estou cultivando dentro de minha cabecinha imaginativa o pensamento de que eu devo ganhar em euros. Não, não há nada de absurdo nisso. Absurdo seria desejar ganhar em libras esterlinas.

O táxi me deixou, ainda debaixo de chuva, em frente ao número 13 da Via de Monte Oliveto, e qualquer pessoa pode ver, no Google Maps, uma panorâmica da rua em que estou hospedado [basta clicar no link "vista da rua" que aparece dentro do balaõzinho branco]. Toquei a campainha e a senhora Bigi abriu automaticamente a porta, descendo em seguida para me recepcionar na sala de espera do prédio. Subimos, de elevador, até o segundo andar. Bigi simplesmente desandou a falar italiano e eu estava só esperando o momento em que ela dissesse, em inglês, “may I continue speaking italian?”, “posso continuar falando italiano?”, ou, pelo menos, “capisce?”, “está me entendendo?”, mas esse momento nunca aconteceu. Sorte minha que eu conseguia entender quase tudo que Bigi falava. Alguns minutos mais tarde, quando estávamos sentados à mesa da sala, só pra me certificar, perguntei “parla inglese?”, “fala italiano?”. “Non, non”. E eu achei maravilhoso, porque não poderia usar o inglês, que tem sido minha muleta durante esses dias de viagem. Na casa de Bigi, não terei alternativa: comunicação só em italiano, por mímica ou telepatia.

Meu quarto é pequeno (entre 12 e 15 metros quadrados), mas muito simpático e bem distribuído. Tem uma cama de solteiro, rodeada por uma prateleira (excelente para colocar livros, revistas, dicionários, guias de viagem...), uma mesa com tampo de vidro ampla o bastante para o abajur, o notebook, o mapa de Firenze, a água e outras coisinhas mais, e dois armários apropriados para guardar de tudo: sapatos, roupas, cabos (impressionante a quantidade de cabos, carregadores e adaptadores que eu trouxe), mochila e mala. Também tem um aquecedor (fundamental, embora o quarto e a casa, como um todo, pareçam naturalmente quentinhos; ou será que o aquecedor já está ligado?). Mas o que me cativou foi a janela de vidro que cobre toda a extensão da parede e que, mesmo com a cortina, que é verde e creme e translúcida, permite ver uma árvores altas e lindas, e as sacadas do prédio vizinho, muito bem arborizadas. A mesa defronte da janela me pareceu o lugar perfeito para escrever e para outra coisinha: desenhar.

“Você desenha?!” Sim, não, quer dizer, mais ou menos. Eu gostava de desenhar e pintar quando criança, até colocava meus quadros na parede. Mas por volta dos 9 anos, o desenho e a pintura sumiram da minha vida. Em Teresina, em determinada época, eu decidi desenhar todo dia. Devo ter feito isso por uns sessenta dias seguidos, fazia parte da minha rotina maravilhosa de acordar sem despertador, caminhar à beira-rio, beber uma vitaminada caprichada, fazer um cocozinho, tomar banho ouvindo rádio, fazer a revisão diária do pathwork, meditar e desenhar. Só depois disso tudo é que eu ia para a universidade. Eita vidinha boa aquela! Preciso tê-la de volta qualquer dia desses. Melhorada, é claro.

Mas voltando ao desenho e à pintura. Tudo em Firenze convida a isso. Os museus, as galerias, os artistas produzindo no meio da rua, as cartolerias (papel aqui se chama “carta”) cheias de cadernos, lápis, tintas e pincéis. Então bateu novamente a vontade de desenhar.

Conversando com Bigi, acertei os detalhes da estadia: café da manhã, chave do apartamento, etc. Fiz parte do pagamento e perguntei sobre ônibus para o Istituto Italiano (tem um que pára aqui na esquina e vai até a porta do Istituto), sobre algum supermercado nas proximidades (tem um a menos de 500 metros) e sobre internet (Bigi disse que ainda não tem, mas que já havia encomendado, embora o tempo de instalação possa levar uma semana). Depois da conversa, resolvi sair para meu programa preferido na Itália: caminhar. Só que eu tive de dizer isso em italiano, com a ajuda de Bigi, claro: “Io vado passegiare per vedere d’intorno”. Claro que deve ter um tanto de erro aí, mas já era um bom começo: “vou passear para ver a vizinhança”. E fui.

Comecei pelo supermercado. Estava curioso pelo nome. Bigi tinha dito algo como “S lunga”, e eu estava me perguntando se a bodega de Seu Lunga, o famoso antipático do Ceará, já tinha filial internacional. Talvez. O nome do supermercado é “esselunga”, que quer dizer... não faço a mínima idéia. Dei uma entradinha só pra ver quão grande era. Uma espécie de Mercadinho São Luiz do tempo em que havia mercadinhos São Luiz. Saí sem comprar nada, pois voltaria mais tarde.

Decidi pegar o ônibus para ensaiar o trajeto que farei amanhã para o Istituto Italiano. Era o ônibus de número 6, que passou logo, logo. Em Roma, só peguei metrô. Em Bologna, era possível comprar a passagem, de 1 euro, no próprio ônibus, colocando moedinhas numa máquina. Quando o bilhete era cuspido da máquina, era só convalidar. Na Itália toda existe essa mania: você compra o bilhete, de trem ou de ônibus, mas tem que convalidar numa maquininha que dá uma mordida no bilhete e registra a data, a hora, o ônibus, o pai, a mãe... Isso tudo, me parece, apenas para desempregar o trocador. Coisa de gente civilizada: você pode andar no ônibus sem pagar, se quiser. Só torça para não aparecer alguém fiscalizando. O valor da multa é de não sei quantas passagens. Mas o fato é que entrei no ônibus 6 e não havia a maquininha de vender bilhete, só a de convalidar. Tive que me dirigir ao motorista, que me vendeu um bilhete por 2 euros (já falei pra parar de ficar convertendo em reais, assim você não vai se divertir). Mais tarde descobri, comprando um outro bilhete numa tabacaria, que o bilhete normal custa 1,20. Eu pagara 80 centavos a mais por um “biglietto a bordo”. Aqui custa caro falar com o motorista.

Desci do ônibus na Via de Martelli, a rua do Istituto, praticamente de esquina com o imponente Duomo, e fiquei pra lá e pra cá tentando localizar o número 4. Niente! Nada. Resolvi não me preocupar com isso, e nesse exato momento senti falta de minha câmera fotográfica digital. Não, eu não tinha sido roubado, havia deixado a câmera em casa mesmo. Mas é que lamentei o fato de não poder tirar uma foto dos guarda-chuvas. Eu pensei que eu era o rei da cocada colorida, a única pessoa na Itália a ter um guarda-chuva de uma cor chamativa. Quanto engano! A rua estava pintada de guarda-chuvas de todas as cores. Pense numa cor... ela estava lá: branca, preta, marrom, lilás, verde, amarela, azul, vermelha... E não bastasse haver todas as cores, ainda havia combinações de cores: guarda-chuvas vermelho com branco, azul com amarelo... Está achando pouco? Pois também havia guarda-chuvas de múltiplas cores, como se fosse um arco-íris. Que espetáculo! E como era bom participar daquela explosão de cores com meu discreto guarda-chuva verde. Para vocês terem noção da importância dessa aquarela, tenho que lembrar que as cidades italianas que conheci até agora são todas em tons pastéis. Não vi nenhuma casa, prédio ou apartamento pintado de verde, azul, amarelo. Tudo vai de um vermelho barro a um cinza, passando pelo creme. Agora, a beleza tem seu preço, e o preço eram os esbarrões de guarda-chuvas naquela multidão que circulava pelas ruas do centro histórico de Firenze. Eu tinha que procurar imediatamente um refúgio. Adivinhem o que encontrei?

Isso mesmo, uma libreria: seca, quentinha, enorme, lotada de livros. Logo após a porta, um monte de guarda-chuvas e sombrinhas no chão. Aliás, uma repetição do que eu tinha visto no supermercado: um monte de guarda-chuvas acumulados na entrada. Eu fiquei naquela, deixo-não-deixo, deixo-não-deixo, deixo-não-deixo... deixei. Envolvi-me tanto com os livros que até me esqueci que tinha deixado um guarda-chuva na porta. Dei uma olhada geral em todas as sessões da livraria, que eram muitas. Fiquei particularmente atraído por um livro com as fábulas de Andersen e por um manual de desenho. Também dei uma olhada nos dicionários de italiano (já está na hora de começar a usar um dicionário italiano-italiano). Mas resolvi não comprar nada, esperar pra ver como será o primeiro dia de aula, que tipo de material terei disponível no Istituto, coisas assim. E, ao sair, não é que meu guarda-chuva ainda estava lá, verdinho, verdinho.

Voltei para a chuva, mas apenas por poucos metros. Parei na frente de um restaurante pra olhar o menu, que sempre fica exposto na rua.

“O teu sorriso se abre feito uma borboleta”, “Tu sorriso si sfana feito una farfalla”. Quem assistiu e amou “O Carteiro e o Poeta”, há de lembrar dessa frase. E foi dela que lembrei quando vi “Farfalle de alguma coisa” no menu. Então, naquele restaurante, eles serviam borboletas? Não pensei duas vezes. Entrei já com água (colorida) na boca. Enquanto as borboletas não vinham, fiquei ansioso. Como seriam? Estariam já mortas ou ainda vivas? Viriam dentro de uma cúpula de vidro? Eu as comeria com uma espécie de canudo de boca bem larga? Que tipo de tempero elas tinham? Quase não acreditei quando o garçom colocou o prato sobre a mesa. Aquilo era melhor do que eu tinha pensado. Era uma massa no formato de borboletas. Dezenas de pequenas borboletas em meio a um molho branco e pequenos camarões. Espetei uma borboleta e pus na boca. Meu sorriso se abriu feito uma borboleta. Que delícia! Depois outra, e outra. As borboletas voavam cada vez mais rápido do chão do prato para o céu da minha boca. Até que... não havia mais borboletas no prato, apenas o gosto macio de dezenas de guarda-chuvas coloridos na minha boca.

Continuando o ensaio de rotina, tomei o rumo de volta para casa, a pé. Esse é meu pensamento, pelo menos enquanto o tempo estiver frio e fechado: ir de ônibus e voltar a pé, aproximadamente dois quilômetros e meio. Caminhei na direção do rio Arno, passando por uma espécie de Beco da Poeira (só lembrei da minha mãe) de Firenze. Cruzei a Ponte Vecchio e tomei a primeira paralela ao Arno, que na verdade é uma transversal ou radial (vocês sabem, eu já falei demais da geometria urbana da Itália). Essa rua vai dar direto no supermercado do Seu Lunga, onde comprei Activia (ah, essa globalização), torradas (para o jantar), chocolate (para qualquer hora) e sabão em pó (para lavar meias e cuecas). Devo confessar que também comprei papel, lápis, apontador e borracha. Sim, não resisti ao desejo de desenhar. O bloco de papel 200g está aqui ao lado do notebook em que escrevo. À esquerda, dentro de um copo, estão os lápis, a borracha e o apontador. A janela, em frente, espera só que eu abra as cortinas. E, qualquer hora dessas, eu volto a ouvir o ruído gostoso do lápis sobre o papel.

sábado, 28 de março de 2009

Ao longo do Arno, embaixo das cobertas

Hoje resolvi caminhar no sentido oposto ao centro, na direção da área residencial onde ficarei hospedado a partir de amanhã. É uma área que está nos limites do mapa que recebi na recepção da pensão, então não me surpreendi quando me perdi. Quando percebi que havia me perdido, eu estava numa praça não indicada no mapa, e havia uma quadra onde alguns meninos, e uma menina, jogavam futebol. Eram muitos meninos para uma só quadra, e a cena me trouxe uma lembrança antiga de colégio, minha primeira aula de educação física no 7 de Setembro. Como recreação, o professor Pires jogou uma bola no meio da quadra e todos nós, com 7 ou 8 anos de idade, corríamos atrás da bola. Não havia organização nenhuma: apenas um monte de meninos querendo dar um chute que fosse numa bola. Foi mais ou menos isso que eu vi hoje, na Piazza Torquato Tasso.



Já que estava perdido mesmo, resolvi vagabundear um pouco por alguns minutos. Fiquei pensando que talvez os italianos não tenham uma palavra que seja equivalente a "paralelo". Mas lembrei de que há excelentes matemáticos italianos, então concluí que os italianos apenas não aplicaram o conceito de paralelismo às ruas, que são curvilíneas e labirínticas. Quando me cansei da vista, tomei o rumo do rio, o Arno, que corta a cidade de Florença. Quando cheguei na beira-rio, vi uma mulher correndo e subi uma escadinha para ter acesso à pista de corrida e caminhada: uma linda visão.

Um pouco mais adiante, nessa mesma pista, havia um parquinho para crianças. Os brinquedos já tinham me impressionado na praça Torquato Tasso, mas só agora resolvi fotografar. Em Roma eu já tinha observado que as coisas são mais estilizadas, quase tudo recebe um toque estético, a coisa não é apenas a coisa, é a coisa preparada para o encanto. Bem interessante também é o chão que, na foto, aparece em cinza escuro ou em vermelho. Quando pisei nele, tomei um susto: é um chão com amortecimento, e a gente sente uma maciez deliciosa a cada passo.

Quando acabou a área de caminhada e do parquinho, resolvi dar uma entrada numa rua sem saída só pra fotografar uma parede de cartazes. É muito comum aqui, em Firenze, a divulgação de eventos culturais por meio desses grandes cartazes. Fotografei vários deles pra depois conferir exatamente os horários e os locais das exposições e dos shows.

Logo em seguida, eu me encontrava na rua que margeia o rio Arno e que recebe nomes diferentes de quarteirões em quarteirões, mas sempre começando com Long'Arno ou Longarno, ao longo do Arno. Eles fizeram uma espécie de barragem para a pescaria, que acaba servindo como praia para algumas pessoas, como aparece aí na foto: o pescador esperando que o peixe fisgue o anzol, e o casal deitado conversando.

Tive que mudar de calçada pra olhar de perto uma vitrine que me chamou a atenção. É impressionante a quantidade de pequenas galerias de arte em Florença. Essa exibia uma pinturas em manequins de plástico. Linda a combinação de cores. O artista chama-se Giuliano Ghelli. Havia o anúncio de uma exposição chamada "Le porte della fantasia", que eu não deixarei de visitar durante a semana.

Do outro lado do rio, me chamaram a atenção essas janelas que formam um portal tanto quando estão fechadas como quando estão abertas. Fiquei pensando na possível transposição disso para um livro, lembrando dos formatos diferentes de livro que vi na Feira de Bologna.

Em Florença, o rio Arno é cortado por várias pontes, sendo a Ponte Vecchio a mais famosa. Quando eu cheguei na ponte imediatamente antes dela, dei uma entrada e pedi a um casal para tirar uma foto minha com ela ao fundo. É curiosa essa ponte porque tem construções em cima. Eu suponha que deveriam ser lojas de bugingangas para turistas, mas, logo em seguida, vi que estava enganado.

A rua à beira-rio era interrompida na altura dessa ponte em que tirei a foto. Pra me aproximar da Ponte Vecchio, tive que pegar uma rua paralela, ou razoavelmente paralela, já que o paralelismo das ruas, como já falei, não parece ser uma preocupação para os italianos. Essa rua combinava construções antigas com edifícios mais modernos, como esses aí da foto: uma bonita combinação.

Na mesma esquina desses prédios, havia uma papelaria, coisa também muito comum em Firenze. Mas não são essas papelariazinhas escolares, não. São papelarias cheias de objetos feitos para atrair nosso olhar e tentar nosso tato. Como já passava de 13h, a papelaria estava fechada, mas tirei uma foto desse marcador de livros com uma frase de Leonardo da Vinci que me fez lembrar de Vó Isolda: "O gênio é paciência."

Antes de chegar na Ponte Vecchio, resolvi dar uma parada para almoçar. E parei no lugar certo, porque comi o melhor nhoque da minha vida: um gnocchi quattro formaggi que ainda está derretendo na minha boca. Ainda pensei em esperar para comê-lo amanhã, que é o dia certo do mês pra comer nhoque, mas fiz bem em antecipar: delícia, delícia, delícia.

Enfim Ponte Vecchio. Sabe de que são as lojinhas sobre a ponte? Joalherias. Quem diria? Se um dia aquela ponte cair, uma pequena fortuna irá long'arno. É tanto brilho, é tanto ouro que até ofusca a vista. Incrível o contraste do burburinho da ponte com a área residencial em que eu estava alguns minutos antes: parecia outra cidade.

No meio da ponte, tem uma estátua. Na cabeça da estátua, tem um pombo. Os pombos são um capítulo à parte em toda a Itália. Eles se sentem os donos do pedaço. Ao invés de fugirem dos humanos, ou ficarem mendigando migalhas de pão, eles levantam voo e aterrissam na nossa frente, tirando fino e quase esbarrando na gente.

Ao redor da estátua tem uma grade com uma plaquinha dizendo que é vietato (ou seja, proibido) colocar cadeados nos ferros. Cadeados?! Quem teria uma ideia maluca dessas? Pelo jeito, muita gente, ou pelo menos muitos casais de namorados que escrevem seus nomes nos cadeados e os prendem às grades de ferro. Deve ser uma forma de garantir a segurança do relacionamento, ou algo assim.

Atravessando a ponte e caminhando um pouco no sentido do Arno, eis a Galeria Uffizi. Dentro tem obra de arte que nem presta, mas hoje resolvi apenas dar uma passada de reconhecimento externo. No pátio, muitos pintores vendendo suas aquarelas ou se dispondo a retratar turistas. Essa foto aí, tirada do pátio, mostra uma outra coisa que tenho visto bastante na Itália: guindastes. Em Roma, em Bologna, em Firenze, há sempre vários guindastes. Parece que o país todo está em construção.

Mas o que mais me chamou a atenção no pátio da Galeria Uffizi, na verdade nas escadarias, foi um homem vestido de cupido que brincava, aos beijos e abraços, com as pessoas que lhe davam alguns trocados. Infelizmente não consegui gravar uma cena hilária que aconteceu logo que cheguei em frente a ele, mas essa aí dá uma idéia da diversão. Na cena que não gravei, o marido filmava a esposa abraçada com o cupido e, ao final da performance, o marido se aproximava e... tascava um beijo na boca do cupido. Depois puxava a esposa pela mão e saíam correndo: o marido com a boca e o nariz completamente brancos de tinta de maquiagem.



No final do pátio da Uffizi, na entrada da Piazza della Signoria, fiz uma panorâmica de 360º com as atrações do lugar: um violonista, os artistas performáticos (o cupido bem ao fundo), as estátuas e o... limpador de ruas. Fiquei encantado por esse limpador desde a primeira vez que o vi, na estação Termini, em Roma. Eu sempre achei muito inglório o trabalho dos garis e dos lavadores de chão, limpando enquanto as pessoas já estão sujando novamente. Esse carrinho aí é uma maravilha.



Estou impressionado com o resultado fotográfico e videográfico do dia. Caminhei só umas quatro horinhas e vi isso tudo! Parecia que eu estava adivinhando que no final da tarde começaria a chover e que toda minha vontade -- plenamente realizada -- seria ficar na cama, embaixo das cobertas, cochilando, lendo, escrevendo e vendo TV.

Quanto a amanhã, um pouquinho de ansiedade: dia de mudança. Sairei do hotel e irei para uma casa de família, onde permanecerei por quatro semanas, enquanto faço um curso de italiano no período da manhã. Sem contar que nessa madrugada começa o horário de verão -- embora o tempo não esteja nem pra primavera -- e eu terei uma hora do meu dia roubada -- não será nem emprestada, já que em setembro ou outubro, quando a hora for devolvida aos italianos, eu não estarei mais aqui.

De volta pra casa?

Na saída de Bologna, meu sentimento era um misto de alívio e de preocupação. Alívio por estar livre dos contratempos da cidade. Preocupação por temer que algo parecido acontecesse em Florença e que eu me decepcionasse com uma das duas únicas cidades do mundo que eu tinha vontade de conhecer -- a outra é Florianópolis.

Então desembarquei na estação de Santa Maria Novella meio desconfiado. Mas havia um centro de informações para turistas -- aberto -- e isso já me acalmou um pouco. A caminhada até o hotel também foi animadora. Percorrendo a Via della Scala, procurando pelo número 1, vi de tudo que alguém pode precisar: restaurantes, lanchonetes, gelaterias, lavanderias, papelarias... Eu só ficava me perguntando onde estaria a escada, porque eu estava traduzindo "scala" por "escada". Quando cheguei ao hotel, pensei que tivesse me enganado de tradução, mas foi só abrir a porta para eu ver uma enorme escada que eu teria que subir para chegar a algum lugar que fosse a recepção. Na verdade, depois do primeiro vão de escada, havia outro. E depois deste, mais outro. Ufa!

Mas a senhora que me atendeu era simpática, e se chamava Cristina, e isso -- acreditem -- é meio caminho andado. O hotel é antigo e simples, acho que seria mais adequado chamá-lo de pensão, e eu tive uma empatia imediata com meu quarto. Um lugar onde eu poderia morar tranquilamente por um mês. E, se não bastasse, a internet era gratuita. "Talvez pegue no quarto", disse Cristina, "mas, se não pegar, com certeza pega no hall", na verdade, em um pequeno palco situado no lugar onde o corredor faz a curva. Fiz logo o teste. Não deu sinal no quarto, mas consegui uma boa conexão no canto da curva do corredor, com o notebook apoiado sobre uma mesinha simpática. Atualizei o diário de viagem e liguei para Alba, que estava me ouvindo muito baixo e se impacientou.

Voltei para o quarto, tirei algumas coisas da bagagem e saí para a rua, tendo o mapa que Cristina me deu no bolso do casaco. Não sei o que me deu, mas saí do Tourist House sem cachecol nem luvas. Foi bom assim: o frio estava no confortável limite entre o insuportável e o suportável, algo em torno dos 15 graus. Almocei na Grotta di Leo. Pela primeira vez na Itália, escolhi o menu turístico, com entrada, primeiro prato, segundo prato, acompanhamento. Pensei que seria muito, mas é tudo em pequena quantidade. De todo modo, foi mais do que eu estava acostumado a comer, e devo retomar meus almoços mais leves a partir de amanhã.

Para ir ao centro da cidade, onde estão as principais atrações turísticas, tive que passar novamente em frente à pensão. E em frente à pensão há uma sorveteria, una gelateria. Saí chupando o sorvete (aqui não é padrão se oferecer a colher) e vi que tinha um banco do lado de fora. Sentei ali e fiquei olhando a paisagem, que consistia de uma antiga igreja, Santa Maria Novella e de um homem tirando fotos de sua mulher ou namorada. As fotos devem ter ficado bonitas, independente da habilidade do fotógrafo.

O certo é que, independente da paisagem, eu me sentia à vontade. Havia algo no ar que me entrava pelo nariz de forma bastante familiar. Quando comecei a caminhar na direção do Duomo, o sentimento de familiaridade só crescia. Eu comecei a ralentar o passo e a sorrir sozinho. Pode parecer estranho eu estar dizendo isso há milhares e milhares de quilômetros de Brasília, de Teresina e de Fortaleza, mas a sensação foi de voltar para casa.

Dei uma volta no Duomo, que é lindo, e olhei todas aquelas pessoas, todos aqueles turistas, como um fiorentino olharia, admirando a admiração deles diante de algo que pra mim era de uma lindeza comum, cotidiana. Voltei para o hotel.

Ontem escrevi que essa fase da viagem, em Firenze, seria de estudo. Mas me lembrei que não foi assim que a concebi originalmente. A idéia de passar um mês em Florença era pra poder viver como italiano, e não como turista. Matricular-me num curso foi uma maneira de me socializar melhor.

Então se é pra viver em Firenze, o que eu poderia fazer numa sexta-feira à noite? Pegar um cineminha. No retorno do passeio pelo centro, a internet pegou no quarto, então pude pesquisar os filmes e cinemas na maior tranquilidade. Optei por um cinema a 400 metros da pensão e por um filme chamado "Diverso da chi?", algo como "Diferente de quem?"

No caminho até o cinema, mais surpresas boas: pequenas lojas abertas. Interessante como, desde o domingo terrível em Castel Maggiore, lojas abertas me trazem uma segurança de colo de mãe.

O cinema se chamava Fulgor. As salas tinham nomes de planetas. Entrei na sala Mercurio, que estava longe de estar lotada, mas fiquei impressionado como os italianos falam. Felizmente, não muito durante o filme. "Diverso da chi?" é uma comédia romântica sobre um triângulo amoroso entre um casal gay e uma solteirona. Um dos homens do casal, candidato a prefeito, se apaixona pela solteirona, que é candidata a vice-prefeita pelo mesmo partido. O desdobramento da situação é, ao mesmo tempo, hilário e enternecedor. Não consegui entender tudo o que diziam, perdi algumas piadas (em que todo o cinema ria), mas consegui rir algumas vezes (mesmo quando os italianos não riam) e gostei bastante do filme: um bom programa leve.

Voltei pra casa. A sensação de casa foi mais intensa porque a recepção fecha às 18h, então ficamos com a chave da porta de entrada. Não é pra se sentir em casa abrir uma enorme porta de madeira de um prédio antigo no centro da cidade? Quando cheguei no quarto, não consegui dormir imediatamente. Estava excitado. Na verdade, durante a viagem, essa foi a primeira vez em que saí do hotel à noite. Eu sempre caminhava durante o dia e ficava exausto à noite. Em Firenze, mesmo depois de uma viagem no meio do dia e de um passeio à tarde, eu ainda tinha tido disposição para sair à noite. Bom sinal.

Enfim, coloquei-me debaixo das cobertas, que me aqueceram tão bem, e dormi.

P.S. - Esse relato sairia sem imagens. Talvez porque Firenze tenha me parecido tão familiar que nem pensei em tirar fotos. Afinal, quem tira fotos da própria casa? Mas então resolvi pegar algumas imagens da internet dos lugares por onde passei. No final das contas, dá no mesmo.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Um peixe dentro d’água

Descobri que amo a rotina. Redescobri. De vez em quando, esqueço disso e me ponho a extrapolar a aventura, esquecendo meus limites. E meus limites são: tempo sozinho sem ter que fazer nada; e conexão com a internet para me comunicar e descobrir coisas.

Então, tendo pago o karma, ainda me restavam três dias em Bologna. E a quarta-feira já começou melhor. Caminhei 500 metros até a feira, e cheguei bem disposto e animado. Tirei até foto, sorrindo. Achei genial o logotipo desse ano. A princípio, tem-se a impressão de que são caracteres orientais – o país homenageado desse ano é a Coréia. Mas depois se percebe que os caracteres são ocidentais, apenas estão estilizados à maneira oriental.

O dia-a-dia na feira resume-se basicamente a percorrer os estandes, dar uma parada naqueles que mais chamam a atenção, folhear alguns livros e recolher alguns catálogos e marcadores de livros. Por duas vezes, já enviei um grande envelope cheio desses materiais para o Brasil, já que não adianta eu ficar carregando isso aqui pela Itália.

De vez em quando, também arrisco uma conversa com alguém do estande. Por exemplo, passando pelo estande da editora da universidade de Bologna, vi o atendente rabiscando algumas coisas numa folha de papel. Na verdade, a folha toda estava rabiscada, numa só cor, o vermelho, e o padrão abstrato me atraiu. Perguntei o que era, e ele falou que uns desenhos. Pedi pra ver de perto, e me surpreendi. O que pensei serem rabiscos eram, na realidade, desenhos escondidos, feito aqueles jogos de passatempo que eu fazia quando criança, tentando adivinhar, num quadro cheio de traços, a forma de pessoas e de animais. Troquei e-mails com Andrea (aqui o nome é masculino), e pedi-lhe que me mandasse alguns daqueles desenhos escaneados para que eu tentasse fazer uma história.

Mas o lugar mais impressionante da feira é uma sala que, no primeiro dia, tem apenas paredes brancas, mas logo, logo, vai se enchendo de amostras de trabalho e anúncios de ilustradores. É um lugar que vai se construindo. Uma beleza estranha e estrondosa, feita de fragmentos de pequenas belezas. Quanta gente talentosa desenha nesse mundo! Fiz esse pequeno vídeo para vocês terem uma idéia da sala.

Quando já estava me preparando para sair, arrumando a mochila próximo à lanchonete, perguntei as horas a uma homem de traços levemente orientais. Ele respondeu, eu agradeci e, enquanto eu terminava de me organizar, ele perguntou se eu era ilustrador. Falei que era escritor, e começamos a conversar. Ele trabalha para uma empresa chamada FikaPublishing, que produz conteúdo para os iPhones: livros infantis adaptados para a tela de um celular. Ele me mostrou um exemplo, e gostei bastante da idéia de colocar livros em telas, ainda mais porque os direitos de autor são de 63%, bem mais que os 10% a que temos direito num livro convencional. Ainda estou me coçando para acessar o site e ver as possibilidades. No final, perguntei o que queria dizer “fika”, e ele falou que, em determinada língua nórdica (esqueci o país), a palavra significava uma parada no trabalho para tomar um lanche e conversar um pouco. Comentei com ele que era justamente o que estávamos fazendo naquele momento. Ele riu. Despedi-me de Dat, e tomei meu rumo de volta ao hotel.

No dia seguinte, o último da feira, eu havia combinado um almoço com Elena, com quem eu tinha mantido contato por e-mail, já que ela seria uma das minhas possíveis anfitriãs em Bologna pelo CouchSurfing. Mesmo com o tornozelo meio deslocado, Elena me guiou por um pequeno passeio pelo centro de Bologna, e me levou para almoçar um delicioso ravioli, cujo único defeito era ser pouco. Aliás, contra todos os prognósticos, tenho emagrecido desde que cheguei à Itália. Depois do almoço, ela quis me mostrar o melhor sorvete do mundo, na Gelateria Casteglione. Tomei um sorvete triplo de cacau, pistache e edoardo. Isso mesmo, havia um sorvete chamado “edoardo”. Delicioso, é claro. Aliás, o sorvete inteiro era de uma cremosidade que fazia carinho na boca. Não sei se é o melhor sorvete do mundo, mas sempre que pensar em sorvete, vou lembrar dele.

Elena, tentando desfazer a primeira má impressão que tive de Bologna, fez de tudo para me alegrar durante nosso horário de almoço. E conseguiu. Falei pra ela que deveria tê-la conhecido logo no primeiro dia. Ela fez questão de me levar até a parada do ônibus que conduzia à feira, para que eu não corresse o risco de me perder mais uma vez em Bologna.

De volta à feira, por volta das duas da tarde, pensei que ia comprar muitos livros baratos, pois me avisaram que as editoras, para diminuírem a bagagem da volta, vendiam os livros a preço de banana. Mas cheguei um pouco tarde. Os estandes estavam praticamente todos desmontados ou as bananas que haviam me interessado não estavam mais disponíveis. Comprei apenas três bananas argentinas de uma editora de que gostei bastante: Pequeño Editor. Eu também estava de olho em alguns livros italianos, mas, como eles não tinha problema de bagagem, os preços estavam de damasco. Encerrei então minha participação na feira. Agora só restava esperar pelo dia seguinte para tomar o trem para Firenze.

Aproveitei o tempo no hotel para atualizar os diários de viagem, continuar a leitura de Pinocchio, no original, e ver um pouco de TV. Minha compreensão do italiano está melhorando, e olha que eu só vou começar meu curso de italiano na segunda-feira.

Aliás, percebi que essa viagem está acontecendo em fases. A primeira, em Roma, foi a fase turística. Aqui, em Bologna, foi mais trabalho. Em Firenze, será mais estudo. E quando sair de Firenze, no final de maio, terei ainda umas duas semanas numa quarta fase que não sei exatamente como será: talvez a fase da extrema saudade. Deve ser esse um dos sentidos de se aventurar: jogar-se ao vento, à sorte, à ventura.

terça-feira, 24 de março de 2009

Karma à bolognesa

A expectativa era a melhor possível. Cinco dias em Bologna, aproveitando a maior feira de literatura infantil do mundo e sendo hospedado por uma italiana, que eu não conhecia pessoalmente, chamada Giulia (nome que, trocando GI por J, só me traz as melhores recordações).

Quando estava planejando a viagem, ainda no Brasil, eu havia conhecido uma comunidade chamada Coachsurfing, surf de sofá, que consiste no auxílio mútuo entre viajantes. O auxílio pode incluir hospedagem. E eu consegui que uma integrante do Coachsurfing, a Giulia, me hospedasse.

O combinado era o seguinte. Eu chegaria no final da tarde na Estação Central de Bologna, depois pegaria um trem para Castel Maggiore, uma espécie de cidade-satélite de Bologna, onde mora Giulia. De lá, eu telefonaria e Giulia me pegaria na estação. Mas não foi exatamente assim...

O primeiro impacto foi a Stazione Centrale. Para quem vinha da espaçosa e moderna Termini, de Roma, a estação de Bologna tinha um ar atrasado. Basta dizer que o serviço de informação ao turista já tinha fechado, em pleno domingo. Não consegui pegar um trem para Castel Maggiore, só consegui a indicação de um ônibus. Graças a um italiano simpaticíssimo, que me levou até a parada, e a uma italiana tímida, mas linda, que me indicou a parada certa na qual descer, cheguei em quinze minutos a Castel Maggiore, às 19h, exatamente no horário combinado. Caminhei uns 300 metros até a estação, para ligar de lá para Giulia. Cheguei lá e a estação pareceu deserta. Entrei, e continuava parecendo deserta. Fui até a plataforma, e verifiquei que estava realmente deserta. Eu era a única pessoa naquela estação. Na verdade, a estação estava tão deserta que até os telefones estavam ausentes. Você consegue imaginar uma estação (de trem, de ônibus, de metrô...) sem um aparelho telefônico? Pois existe.

Então saí com uma mochila nas costas e arrastando uma mala em busca de um telefone. Gente, eu até poderia escrever detalhadamente o que passei, mas vou resumir porque só de lembrar já me dá cansaço, desânimo e vontade de choro. Então, uma hora depois, com a ajuda de um romeno, consegui ligar para Giulia, que me pegou próximo à estação.

Giulia tem um apartamento lindamente decorado com objetos de suas viagens.Para jantarmos, fez uma pasta deliciosa – não me lembro qual – à bolognesa. Depois sentamos e conversamos, contando um pouco das nossas vidas. Giulia quis conhecer meus livros, e até leu um deles, Redonda, já que sabe um pouco de português. Antes de dormir, de surfar meu primeiro sofá (que, ao ser aberto, se transformava numa cama), eu estava com vontade de contar o derradeiro dia em Roma e a chegada em Bologna, mas não há conexão à internet na casa de Giulia, então resolvi deixar para fazer isso no dia seguinte, na feira de livros para crianças.

Peguei carona com Giulia, que me deixou em frente ao centro de convenções. A primeira coisa que fiz foi tentar uma conexão, mas todas as minhas 397 tentativas realizadas durante o dia foram frustradas, e o notebook foi apenas peso em minhas costas. Dei uma volta geral pela enorme feira: é aproximadamente do tamanho de três bienais do livro do Ceará ou de São Paulo, com o detalhe que aqui só são livros infantis. Um mundo que as crianças adorariam visitar, caso lhes fosse permitida a entrada, mas a feira é só para editores, ilustradores, autores e agentes literários. Os livros nem estão à venda. São só pra ver e folhear.

Mas a verdade é que não aproveitei direito o primeiro dia de feira sem internet (consequentemente sem poder falar com Alba nem poder atualizar o blog). Às 18h, meu desejo era voltar pra casa, parando para comprar o Yakult e garantir minha felicidade intestinal por mais alguns dias. Peguei um ônibus, lotado, até a estação central. Dessa vez consegui informação sobre o trem para Castel Maggiore: um funcionário me disse para pegar o trem 11, com destino final em Veneza, na plataforma 2. Corri e entrei no trem a tempo: a tempo de esperar uns 10 minutos antes dele partir – em pé, porque os lugares sentados estavam todos ocupados. Quando as portas se fecharam e o trem entrou em movimento, o motorista indicou os pontos de parada, e eu senti falta dele falar Castel Maggiore. Utilizando o pouco italiano que sei, perguntei para a mulher ao meu lado: “Non ferma in Castel Maggiore?”, “Não pára em Castel Maggiore?” A mulher não soube responder, mas um homem que havia ouvido a pergunta e que tinha entendido minha cara de bezerro desmamado, como que perguntando “e agora, o que é que eu faço?”, respondeu em italiano algo que eu traduzi como: “Desça na primeira estação e pegue um trem local de volta”. “Grazie”, eu disse, “obrigado”. O detalhe é que a “primeira” parada era três paradas após Castel Maggiore. Tudo bem, agora era só pegar o trem local de volta que passaria às... 20:18h. Exatamente. Eu, que a essa hora deveria estar em casa de Giulia, de Yakult tomado, teria que esperar quase uma hora para pegar o próximo trem. E deixa eu resumir de novo porque já estou revivendo tudo aquilo... Depois de uma parada num bar para tomar um cappuccino e comer um chocolate, cheguei em casa por volta das 21h, três horas após sair da feira, completamente exausto e com uma decisão tomada: no dia seguinte, procuraria um hotel na área urbana da cidade. A decisão não me impediu de ter uma noite agradabilíssima com Giulia e seu namorado, Alessandro, que fala bem português e que é praticante de capoeira. “Peccato”, assim Giulia resumiu o fato de eu não permanecer lá. “Realmente uma pena”, eu concordei. Seria uma pena perder aquela convivência tão legal com Giulia e Alessandro, mas eu não tinha mais paciência para lidar com os problemas de comunicação e transporte em Castel Maggiore.

No dia seguinte, suponho que Júpiter, em trânsito, entrou na minha casa 2, a das finanças, porque eu comecei a gastar... Paguei um táxi (9,0) pra ir do centro de convenções, onde Giulia me deixou, até a Stazione Centrale. Paguei o depósito (5,20 por seis horas) de bagagem na estação pra não sair puxando mala enquanto procurava hotel. Paguei tempo de lan house (2,0 por uma hora) pra agilizar a localização e reserva de um quarto. Fiz – e isso, sim, foi um grande investimento – uma reserva no valor de 247 euros por três dias num hotel próximo ao centro de convenções. E paguei outro táxi (9,0) para ir com a bagagem para o hotel. A situação tinha estado tão ruim, nos dois primeiros dias em Bologna, que achei isso tudo uma pechincha. Agora só faltava conseguir conexão na feira. Que nada! Saí correndo do hotel, de notebook nas costas, pra ver se conseguia configurar a rede antes da feira fechar naquele dia, mas a rede wi-fi da Telecom continuava sem me dar acesso, mesmo eu estando disposto a pagar 5 euros por três horas. O jeito foi contratar a rede sem fio do hotel por módicos 5 euros por 30 minutos. Isso mesmo. Mas eu já disse, estava tudo uma pechincha, e pedi logo uma hora por 10 euros. “Mas isso são 30 reais”, você pode exclamar, fazendo mentalmente a conversão monetária. E eu responderei sem responder, lembrando as sábias palavras do cearense que encontrei no albergue Yellow, em Roma: “Quem converte não se diverte”. Minha diversão foi ligar para o celular de Alba via Skype (mais uns trocados) e descer para o restaurante, onde comi mais alguma coisa “à bolognesa”. Ah, como é bom ter um dinheirinho extra para poder esbanjar numa situação de emergência.

No final das contas, foi um karma pago. E quem sou eu pra reclamar de que foi com juros? Vai que eu cometi um crime grave por aqui há alguns séculos, e que agora tenha recebido até um belo desconto.

domingo, 22 de março de 2009

Uma maratona e um arrepio de felicidade

Derradeiro dia em Roma. Rei morto, rei posto. Enquanto eu arrumava minhas malas, Karsten, o amigo de Marco, já estava em nosso quarto, pronto para assumir minha cama. Troquei e-mail com os alemães e lhes dei um abraço, coisa que estranharam um pouco, mas bem penso que gostaram.

Ao fazer o check-out, recebi um bilhete de Íris. Havíamos combinado de nos encontrar em Roma, antes de irmos para a feira em Bologna, mas só hoje recebi seu recado. Ainda fui ao seu hotel, mas ela já tinha saído. Nos encontraríamos só em Bologna.

Como minha gripe houvesse regredido, depois de comer minha conchiglia cioccolata, resolvi sair pra caminhar com o objetivo de rever a Fontana de Trevi e conhecer o Pantheon. Procurando encurtar caminho, o que é um perigo, pois corre-se o risco de se perder pelas ruas labirínticas de Roma, entrei pela Via dei Giardini, a Rua dos Jardins, que tem a forma de um arco de 90 graus e que, segundo o mapa, liga a Via Del Quirinale à Fontana de Trevi.

O risco do atalho rendeu uma coisa inédita e uma surpresa. A coisa inédita foi estar sozinho numa rua de Roma. Minha impressão é de que não havia rua deserta por aqui, onde quer que se entrasse se encontraria alguém. Pois lá estava eu sozinho, fazendo o arco da Rua dos Jardins, quando me surpreendi com um pé de tangerinas, ou de laranjas – estavam muito altas para que eu pudesse pegar uma, comer e definir. Confesso que não tive coragem de procurar um pedaço de pau e tentar derrubar uma laranja daquele verde carregadinho de belezura. Tirei uma foto. Essa aí. Se fosse um vídeo, teria barulho. A rua era silenciosíssima, mas havia um helicóptero parado no céu, a pequena mancha horizontal e negra no alto da foto, entre o prédio e a árvore. Logo adiante, na rua, os carrinhos pequenos, estacionados, são dos Carabinieri, os policiais italianos. A Rua dos Jardins tinha mais carros policiais que árvores.

Quando completei o arco da rua, realmente deparei-me com a Fontana de Trevi, mas tive que esperar um pouco para atravessar a rua porque os corredores da Maratona Anual de Roma estavam passando por ali. Aproveitei para subir uma pequena escadaria e tirar a foto. Quando o fluxo de corredores diminuiu um pouco, deixaram a gente atravessar a rua. Fui tratando de abrir caminho na multidão, descendo os primeiros degraus para me aproximar da fonte. E foi bem nessa hora que aconteceu: um arrepio de felicidade. O vento frio me tocou, mas desta vez não com incômodo, e sim com alegria. A verdade é que me senti feliz, uma felicidade que durou apenas o tempo de um arrepio, dois ou três segundos, mas que, como toda felicidade, é eterna no instante e na memória. A minha felicidade me fez ver também a felicidade dos outros, principalmente daqueles que jogavam moeda na fonte para, segundo a lenda, garantir um retorno futuro a Roma. Depois de jogar minha moedinha, dei uma de paparazzo e filmei um casal jogando as moedinhas. Filmei o casal certo, porque foi lindo. Confiram aí.

A felicidade me encheu de coragem. Coragem suficiente para, ainda me curando de uma gripe e à temperatura de uns 10 graus centígrados, tomar um sorvete de tiramisù. E não é que estava delicioso e desceu muito bem. Lembrei daquelas pessoas que estranham nós, nordestinos, tomarmos sopa no calor. Descobri que tomar sorvete no frio é tão delicioso quanto.


Continuei minha caminhada na direção do Pantheon, mas, no meio de uma ruelazinha de uns 3 metros de largura, havia um cartaz sobre uma exposição de modelos criados a partir de desenhos de Leonardo da Vinci. Parei para ler o cartaz e ver onde era a exposição. Pois não é que era ali mesmo. Mesmo achando que estaria fechada, porque era domingo, entrei no pátio. Para minha surpresa, a exposição estava aberta. Paguei os 7 euros e entrei. Fiquei impressionado com a simplicidade e a beleza da exposição. E desconfiei, vendo aquilo tudo, que Leonardo talvez tenha sido uma reencarnação de Dédalo, o grego que construiu o labirinto. Os dois tinham o mesmo gênio.

Finalmente cheguei ao Pantheon, a “morada de todos os deuses”. Mas o que mais me chamou atenção foi um homem de traços orientais, sentado no chão, encostado numa parede, com seu bloco de desenho no colo. Fiz um pequeno filmezinho dele.

Depois entrei no Pantheon, que hoje é uma igreja. Sentei-me num dos bancos de madeira, fechei meus olhos e fiz um agradecimento a todos os meus “deuses”, a todos os meus guias, a todas as pessoas que já me orientaram nessa vida. Fiquei um pouco em silêncio, levantei-me e continuei minha caminhada.

Aqui e ali, eu cruzava com o percurso da maratona, e me comoviam as cenas de entrega de garrafas d’água, de beijos e de gritos de incentivo. Cheguei, enfim, à escadaria espanhola que, como alguém já havia me dito, não tem nada demais. Aliás, tinha até de menos, porque algumas moças tiravam os agasalhos e blusas para se bronzear, deitadas sobre os degraus e corrimões. Não tive a cara-de-pau de tirar fotos mais picantes, então fiz só essa aí, de dois “banhistas” tomando sol, mas com roupa mesmo. Ao fundo, os maratonistas.


Já tinha cumprido meu programa do dia, e ainda me restava algum tempo. Então, quando cheguei ao topo da escadaria, resolvi me dar ao luxo de ficar parado, vendo um desenhista fazer o retrato de uma turista. O desenhista me pareceu muito gentil, pois, enquanto desenhava, omitia as rugas da retratada, que tinha uma cara de muita curiosidade. Eu fiquei até o final só pra ver o sorriso da mulher ao ver o retrato. Foram deliciosos minutos de silêncio, só vendo o movimento das mãos do desenhista e a imobilidade do rosto da mulher que apenas, vez por outra, permitia-se ajeitar um pouco o cabelo despenteado pelo vento.

Peguei o metrô de volta para a estação de Termini, um lugar que também se tornou favorito para mim, talvez por ser o lugar das conchiglias. Comprei uns caderninhos de anotações coloridos, para mim mesmo e para dar de presente, almocei uma lasagna (com GN, afinal estou na Itália). Aproveitei para tirar uma foto do interior da estação. Não dá idéia da enorme dimensão dela, mas mostra um pouco dos serviços.

Com tempo e frio de sobra, resolvi esperar pelo trem já na plataforma, quarando ao sol e terminando de ler o livro sobre Leonardo da Vinci. Esse trem que fotografei é igualzinho ao que peguei. Bonito por fora, confortável por dentro. Uma belezura.

Não poderia terminar o relato de meu derradeiro dia em Roma sem mostrar pra vocês o principal instrumento desses quatro dias: o mapa da cidade. Até o defeito dele (não ter todas as ruas, principalmente as minúsculas ruas) foi proveitoso: porque perder-se em Roma é surpreender-se com coisas que, literalmente, não estão no mapa. Despedindo-me mentalmente da cidade, fiquei fazendo uma paródia da famosa frase do filme “O Mágico de Oz”. Dorothy diz: “There’s no place like home” (em tradução livre, “Não há lugar como a nossa casa”). E eu fiquei dizendo: There’s no place like Rome, não há lugar como Roma. Mal sabia eu que ficaria repetindo essa frase como um mantra durante a minha estadia em Bologna. Mas não vamos misturar amor e dor, o relato de Bologna ficará para depois.

Aos aperreados, sem noticia

Fabio, e pessoal que estah acompanhando a viagem. Domingo, sai de Roma e vim a Bologna. Devo estar pagando algum carma por aqui: problemas demais com transportes e comunicaçoes. Espero que as coisas voltem ao normal em Florença, para onde irei no final de semana. Se tudo der certo, contarei o derradeiro dia em Roma, que foi delicioso, e todos esses dias nessa Bologna que exercitou ao maximo minha paciencia.

sábado, 21 de março de 2009

O frio que virou gripe

Hoje não tem foto nem vídeo. Tem gripe e remédio. Quando se está doente, todo lugar estrangeiro perde o encanto e nossa casa – ou o que quer que se equivalha – se torna o melhor lugar do mundo. O Pantheon, que eu poderia conhecer, ou a Fontana de Trevi, que eu gostaria de rever, não foram páreo para um lugar até então subestimado: a cama de baixo de um dos dois beliches do quarto de quinze metros quadrados do albergue Yellow.

Não que o dia não estivesse lindo. Quando acordei, abri a janela e vi um lindo azul no topo do céu. Mas era uma armadilha. O azul seduzia, mas o frio – já fora da coberta eu percebi – era daqueles de se usar duas meias e inaugurar a ceroula. Foi o que fiz. Tentei ser um bom viajante. Levantei-me, caminhei alguns quarteirões, comi uma conchiglia na boulangerie da estação Termini, fui na direção da Fontana de Trevi, passando pela Praça da República. Mas é lá, nos prédios arqueados que circundam a praça, que o vento faz a curva, com direito a cantar pneu e tudo mais. Entrei com gosto na Melbooks, que eu já tinha sondado no dia anterior. Fiz cara de grande interesse em livros – tudo bem, isso não foi difícil, eu já tenho essa cara mesmo –, mas meu interesse maior era o calorzinho lá de dentro, que deu até para tirar o casaco e o cachecol. Peguei "Pinocchio" e comecei a ler, no original. Até que não foi tão difícil. Li os dois primeiros capítulos, folheei tantos outros livros, comprei o "Pinocchio" e fui ver como estava o clima lá fora.

Para minha decepção, o clima era o mesmo. Como pode um dia ser ao mesmo tempo tão lindo e tão frio, insuportável e repelente? Resolvi atravessar o McDonalds pra ganhar dez metros de calor, e resolvi parar para um cappuccino e para uma ida ao banheiro. De lá, fui aos correios, quase vizinho. Enviar cartões postais foi rápido e fácil, mas fiquei fazendo hora, aproveitando o calor, e só saí de lá ao ser expulso por uma funcionária, que disse que eles fechavam mais cedo aos sábados.

Lá estava eu de novo na rua. Poderia ter voltado logo para o albergue, mas estava corajoso, determinado. Caminhei aproximadamente um quilômetro até o Palazzo delle Esposizione, meu porto seguro no meio de minha querida Via Nazionale. Lá, um cappuccino me rendeu quase uma hora sentado num confortável sofá, lendo o livro sobre Leonardo da Vinci que eu havia comprado anteontem e deixado na mochila para uma emergência. E lá eu senti a gripe me rondando. Peguei o guia de conversação em italiano e localizei as palavras para farmácia, gripe, febre, pastilha, garganta e vitamina.

Já no caminho de volta, parei em um ristorante para comer um risotto alla pescara. Tão típico que tive de retirar arroz de dentro de conchas. Delicioso e trabalhoso. Nada a reclamar, isso me deu mais tempo no clima mais ameno do restaurante.

Na farmácia da estação Termini, comprei o remédio para gripe, febre e coisas correlatas e tomei o rumo do Yellow. Bem a tempo de cagar uma fininha que desceu muito bem, não sei se graças ao contínuo Yakult ou se ao início da gripe. Resolvi tirar um cochilo, mesmo sendo quase cinco da tarde. Coloquei o despertador para as dezoito horas, torcendo para que nenhum companheiro de quarto chegasse e me interrompesse o sono.

Esqueci de contar que, ontem, eu e Marco (o alemão), recebemos dois novos companheiros: Dei-shí (assim se pronuncia), um japonês; e, vocês não vão acreditar, Laerte [nome fictício]), um... brasileiro, mas não apenas um brasileiro, e sim um universitário cearense que está morando temporariamente na Espanha e que veio passar o final de semana aqui em Roma. Ele e um bando de outros cearenses. Ontem conversei em português após dois dias. Mas não vou contar as peripécias de meu companheiro de quarto brasileiro quando ele chegou da balada, de madrugada, pois já me basta uma gripe para o dia de hoje.

Vou dormir cedo porque preciso acordar cedo para deixar o albergue amanhã às dez horas. Espero já estar recuperado da gripe, pois meu trem para Bologna só sairá no meio da tarde e terei que ficar zanzando todo esse tempo por Roma. Não, não tenham pena de mim, o albergue permite que a bagagem fique guardada aqui mesmo eu já tendo feito o check-out. E eu sempre terei algum lugar para fugir do frio da rua e me aquecer. Eu só espero que Bologna, mesmo estando mais ao norte da Itália, esteja mais quente do que aqui. Acho que mereço esse milagre.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Filas, filas e... filas

Gente, o que é isso?! Hoje passei mais tempo em filas do que visitando os lugares propriamente ditos. Vi alguns anúncios de grupos guiados que não pegavam filas, mas como ontem, no Coliseu, foi tudo tranquilo, resolvi me aventurar individualmente também no Vaticano. Só que ontem foi feriado não só no Ceará, mas também na cidade do Papa, então quem não pôde entrar ontem, apareceu hoje por lá. Os museus do Vaticano estavam mais lotados que o Castelão num Fortaleza x Ceará de final de campeonato. Por falar em proximidades entre Itália e Ceará, recebi o seguinte e-mail de uma amiga:

Estava num passeio em Roma quando, ao visitar a Catedral de São Pedro, fiquei abismado ao ver uma coluna de mármore com um telefone de ouro em cima. Vendo um jovem padre que passava pelo local, perguntei a razão daquela ostentação. O padre então me disse que aquele telefone estava ligado a uma linha direta com o paraíso e que se eu quisesse fazer uma ligação eu teria de pagar 100 dólares. Fiquei tentado porém declinei da oferta. Continuando a viagem pela Itália encontrei outras igrejas com o mesmo telefone de ouro na coluna de mármore. Em cada uma das ocasiões perguntei a razão da existência e a resposta era sempre a mesma: Linha direta com o paraíso ao custo de 100 dólares a ligação.
Depois da Itália vim para o Brasil e fui direto para o Ceará (de um país para outro país). Ao visitar a nossa gloriosa Catedral de Fortaleza, fiquei surpreso ao ver novamente a mesma cena: uma coluna de mármore com um telefone de ouro. Sob o telefone um cartaz que dizia: LINHA DIRETA COM O PARAÍSO - PREÇO POR LIGAÇÃO = R$ 0,25 (vinte e cinco centavos).
Não me aguentei, e lasquei....
-- Padre, eu disse, viajei por toda a Itália e em todas as catedrais que visitei vi telefones exatamente iguais a este mas o preço da chamada era 100 dólares. Por que aqui é somente R$ 25 centavos?
O Padre sorriu e disse:
-- Meu amigo, você está no Ceará. Aqui a ligação é local.

Não vi a coluna de mármore nem no Vaticano nem na Catedral de Fortaleza, mas a piada é boa e apropriada.

Voltando à fila. Quando chegamos em frente à entrada dos museus (MVSEI VATICANI -- basta clicar sobre a foto para ampliar), me animei porque o frio ia enfim acabar. Porque uma coisa é pegar fila, outra é pegar fila com 10 graus celsius e com vento forte. Mas a fila passou da entrada, foi até a esquina, fez uma espécie de labirinto, deu a volta e só então se aproximou novamente da entrada. Isso tudo com um casal se beijando e se pegando na minha frente. Tortura romana!

Lá dentro, uma verdadeira loucura. Nem dava pra andar nem dava pra ficar parado. O melhor momento do início da visita foi tirar o sapato no restaurante e comer um pedaço de pizza antes de ver as exposições em si. Gostei da Pinacoteca, principalmente de um quadro sobre Adão e Eva no Paraíso. Até aí foi tranquilo. Quando decidi ir no rumo da Capela Sistina, foi um verdadeiro engarrafamento, passando por quinhentas salas antes de olhar pro famoso teto e apreciar as maravilhas de Michelangelo. Minha idéia era fazer uma panorâmica do teto, mas câmeras não eram permitidas na capela. Na verdade, estou cada vez mais convicto de que o melhor lugar para ver quadros não é no museu, mas em livros. O museu é bom apenas para você ter uma idéia das dimensões da obra. Não deu pra ver direito o que Michelangelo pintou com tanto cuidado. Era levantar a cabeça e ser empurrado por alguém. A densidade demográfica na Capela devia ser semelhante àquela de uma câmara de gás dos campos de concentração: todo mundo colado um no outro. E haja pescoço pra ficar olhando pra cima. Na Capela Sistina, devia ter um monte de redes pra gente ficar olhando pra cima com conforto e sem torcicolo.

Vista a Capela, procurei a saída o quanto antes. Gostei da escada em espiral que leva à saída. Muito bonita, labiríntica e perigosa: o que tinha de aviso pra tomar cuidado pra não cair não é brincadeira.

Ainda fiquei fazendo uma horinha na ante-sala antes de sair: voltar para o frio não me pareceu uma boa idéia. Mas lá fui eu. Nos dois dias anteriores, bastaram-me o casaco do Kildare e o cachecol da Alba. Hoje tive de apelas para as luvas do Mateus. E assim fui, todo empacotado para a praça e para a basílica de São Pedro. Adivinhem o que encontrei? Isso mesmo: mais uma filinha de uns trezentos metros, em plena praça aberta e com o vento correndo tão solto quanto os pombos e os meninos que tentavam chutar os pombos.

Quando entrei na basílica, pensei logo: não deveria ser eu a estar aqui, mas minha mãe e minha Vó Izolda. A basílica é imensa, linda e cheia, mas cheia, de obras de arte. Logo após a entrada, à direita está a Pietà, Michelangelo, uma escultura que me comove pelo abandono do Cristo e pelo cuidado de Maria.

Embora o calorzinho dentro da basílica estivesse agradável, eu estava um pouco preocupado com o horário de fechamento do acesso ao domo, à cúpula da basílica. E eu não queria perder isso por nada. Marco, meu companheiro alemão de quarto no albergue, falou que a vista era maravilhosa. Então saí da basílica pra encontrar novamente o frio e a fila, com direito a mais um casalzinho se amassando na minha frente. Aqui se aluga tudo: vespas, bicicletas, fones de ouvido para visitas guiadas... só faltam alugar mulheres em filas frias. Numa hora dessas é que a saudade da namorada aumenta ainda mais.

A subida da cúpula se dá em duas partes. A primeira, de elevator. De lá, há uma vista interna para o altar da basílica, agora já iluminado. Lindo! A segunda fase da subida é a pé mesmo. Apenas 320 degraus. Isso mesmo: trezentos e vinte degraus cada vez menores, e com as paredes se inclinando, já que o domo é arredondando. Já imaginou subir escada meio de lado? Não experimente se não estiver com seus exercícios aeróbicos em dia. Era bom que a vista compensasse... E compensou. Gente, Roma que eu tinha levado tanto tempo percorrendo, caminhando, agora era bem pequenininha. Consegui cavar uma brechinha na murada e, mesmo tremendo de frio com o vento forte (vocês podem ouvi-lo no vídeo), fiz uma panorâmica lá do alto.



Para descer, todos os santos, apóstolos e o próprio papa ajudam. Só então curti a Praça de São Pedro, que é enorme e linda. Num dia menos frio, deve ser uma festa. Incrível a mania de grandeza do povo daqui. Deve ser, relativamente ao país (Vaticano), a maior praça do mundo.

Reabasteci minha garrafinha numa fonte da praça. Se eu passar mal devido à água, passo junto com um monte de italiano. Comprei uns cartões postais, mais pra entrar na loja e me esquentar um pouco, confesso. Depois saí tão rápido quanto pude para a estação de metrô mais próxima: uns infindáveis 500 metros.

Ah, gente, tantos outros detalhezinhos do dia... O novo e barulhento companheiro de quarto, a compra da passagem de trem para Bologna direto numa maquininha automática, minha primeira conchiglia -- de chocolate... mas estou exausto, e tão exausto quanto eu o notebook, que está com bateria baixa.

Grato pelos comentários anteriores. Espero que vocês estejam gostando da viagem. :)

Prometo que amanhã terei um dia mais light. Mais italiano que turístico, espero.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Carros pequenos, grandes monumentos i altri cosi

Acordei com o barulho de meus colegas de quarto. Quando estava pra começar a reclamar internamente, dizendo para mim mesmo "você deveria ter ido para um hotel, essa história de dividir quarto não vai dar certo", ouvi um deles falar: "Wake up, Stephen, it's ten o'clock, time to check out." 10 horas? Já? Eu não acreditei. Tinha dormido quase 11 horas seguidas. Se dois de meus companheiros de quarto -- o argentino Andrés e o americano Stephen-- não tivessem de sair do albergue às 10h, eu teria dormido até o meio-dia. Quando os dois saíram, "Good luck, guys!", dei bom dia ao companheiro que ficara, o alemão Marco, e me aprontei para sair e caminhar durante todo o dia, começando por uma caminhada razoavelmente longa até o Coliseu.

No caminho, não resisti e bati uma foto de um carro parado. [Basta clicar nas fotos para ampliá-las.] Aqui na Itália tem um modelo -- o Smart -- tão pequeno, mas tão pequeno, que tem gente que o estaciona perpendicularmente à calçada. Carro de espertinho mesmo.

Confesso que estava preparado para uma decepção no Coliseu. Essas coisas que são muito faladas às vezes não valem toda a saliva gasta. Mas o Coliseu não decepcionou. É realmente um Colosso. Fiz um pequeno vídeo, uma panorâmica da parte interna. Impressionante a quantidade de gente, vozes e câmeras fotográficas.



Depois fui percorrer outras ruínas próximas, mas me arrependi. A melhor coisa que vi foi um tapume que tapava o acesso a algumas ruínas no Circus Maximus. Cada cidade tem o tapume que merece. Confiram aí a beleza de tapume de Roma.

Cansei-me além da conta, e dei uma parada pra encostar as costas num banco em frente ao Circus Maximus, que me lembrou um pouco a Esplanada do Ministérios em Brasília, embora a foto seja de um ângulo em que isso não fica muito claro.

Acabei me perdendo algumas vezes, o que me permitiu ver cada coisa! Por exemplo, uma cena comum no Brasil: uma típica manifestação político-sindical. O pessoal estava dando voz aos meus pés, que reclamavam dos maus tratos e dos baixos salários?

Outra coisa que vi enquanto procurava meu caminho até a Via Nazionale foi esse outdoor da Hyundai. A princípio, achei um absurdo um outdoor no meio daquela antiguidade toda, mas foi um julgamento precipitado. A Hyundai está patrocinando a reconstituição do prédio. O que se vê na foto, da altura do outdoor para baixo, não é a fachada do prédio em si, mas uma tela com o desenho de como o monumento ficará após a restauração. Simplesmente impressionante.

Depois de muito rodar, consegui chegar à minha, até aqui, rua preferida em Roma: a Via Nazionale. Senti-me em casa. Fiquei à vontade pra comprar um guarda-chuva verde, que por pouco não inaugurei hoje mesmo: peguei uma pequena neblina quando já estava chegando ao albergue Yellow. Depois da Benetton, dei uma parada no Palazzo delle Esposizione. Fui atraído pela livraria, que tinha uns assentos alcolchoados para que eu descansasse. Mas acabei gostando também do Café, onde comi um fusilli frio e gostoso, e depois tomei um cappuccino. Olhei apenas rapidamente uma linda exposição de fotos de todo o mundo da revista National Geographic: estava exausto e sonhando com o alcolchoado da libreria. Fiquei na seção infantil, a única adequada para meu italiano ainda fraquinho. Selecionei três livros, mas contive o impulso consumista e levei apenas um sobre Leonardo da Vinci. É narrado em primeira pessoa, e pareceu relativamente fácil e divertido.

Ainda passei num pequeno mercado para comprar sabonete, pasta de dente e yakult (embora minha prisão de ventre pareça ter ficado mesmo no Brasil). É incrível como mercadinho é igual no mundo todo: se eu não quisesse experimentar novidade, poderia ter comprado a mesma pasta de dentes que uso no Brasil. E dei só uma entradinha em outra libreria, quase no final da Via Nazionale, para sondar o terreno para ir lá com mais calma amanhã ou sábado.

E por hoje foi só. Meu reino por uma cama.