quinta-feira, 2 de abril de 2009

Marmúsica e riofilme

Hoje o Sol tentou ensaiar a primavera. Mas um frio dos invernos invadia sempre o palco, atrapalhando o ensaio.

Caminhando ao longo do Arno, cujo volume tem aumentado com a chuva dos últimos dias, ali pela altura da pescara, onde há uma mudança de nível, a queda d'água faz um som que lembra o mar e faz esquecer a noite mal dormida e o iminente atraso para a aula.

Acordei às 4 da manhã para dar efeito ao laxante que eu tinha tomado na noite anterior. O remédio parecia atravessar meu corpo em ondas, e eu pensei que iria desmaiar. Consegui dormir um pouquinho antes do despertador tocar às 7h30. Não adiantou nada ter colocado o despertador para mais cedo pois o sono me fez ficar mais tempo ainda na cama, pensando se deveria mesmo ir à aula. Mas pra quem está lendo Pinocchio, e tem acompanhado os trágicos acontecimentos que se sucedem sempre que o boneco resolve faltar à escola, achei melhor não arriscar. Mas eu estava falando do Arno, que me lembrava o mar...

Fechei os olhos por um momento, na esperança de ser teletransportado até a Praia do Futuro, mas a concentração na audição só me fez perceber que há uma grande diferença entre o som do rio e o do mar. O som do rio é sempre contínuo. O do mar reflui. O rio é como filme que passa e não volta. No máximo um filme que, se gostamos muito, vemos quatro ou cinco vezes. O mar é feito música que ouvimos vezes seguidas, e que parece mesmo um círculo perfeito em que o final emenda no início. Há beleza nos dois sons, mas o mar se assemelha mais à minha natureza repetitiva.

Mesmo com tais audições e reflexões, cheguei pouco mais de um minuto atrasado, e não perdi nada da aula. Quando acabamos um exercício, Maíra, uma brasileira, cochichou para mim, apontando para as minhas costas: "Eduardo, guarda! La primavera di Botticelli". Virei-me e olhei tão demoradamente quanto pude. Porque aqui, até agora, só se pode ver a primavera nos quadros. E, mesmo assim, a primavera de Botticelli ainda é meio sombria. Talvez o original seja melhor: terei a oportunidade de vê-lo na Galeria Uffizi.

Pra semana que vem, a meteorologia promete que a temperatura vai passar dos 20º e que o Sol vai fazer una anteprima della primavera. Só me resta esperar -- de casaco, cachecol e luvas.

2 comentários:

  1. Junoca, nao fique influenciado pelo Pinoquio, a menos que voce seja tao levado quanto ele. rsrsrs E sobre a primavera de Botticelli, achei muito bonita, mas tive a sensacao de que os rostos nao fazem parte dos corpos, ou sao mais delicados do que eles. Esquisito! Beijos

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  2. Observação interessante, Ceíta. Vai ver que é porque, durante o inverno, as pessoas usam cachecol, então Botticelli estava com saudade do pescoço das pessoas e os fez mais longos do que realmente são. :)

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