No café da manhã, comi pouco. Ainda estava digerindo o jantar de despedida da noite anterior. Um professor e 19 estudantes comemos tudo a que tínhamos direito: pão, salada, sopa, pasta, carne (nem todo dia se consegue ser vegetariano) e doce.
Derradeiro dia de aula. Barbara nos entregou a prova, que havíamos feito ontem, corrigida. Ela não deu nota, mas consegui acertar uns 80%, o que está ótimo para quem praticamente não estudou em casa. 10:30 saímos para um café numa livraria vizinha. Momento de conversar um pouco e de tirar algumas fotos.
No início da aula de conversação, reunimos as duas turmas para um pequeno número musical. Eu havia feito a versão de uma canção de ninar minha e havia ensaiado com o australiano Simone, que não veio. O professor Duccio, que havia nos levado ao jantar de ontem, gentilmente aceitou o convite para me acompanhar ao piano. Meu xará Eduardo fez a gravação.
Que estranho eu falando italiano! Mas foi um momento muito emocionante. Barbara e Ilona choraram. Eu me segurei.
Depois das aulas, desci a longa escadaria da escola e senti uma dor no coração quando a pesada porta de ferro se fechou atrás de mim. Fiz o agradecimento que sempre faço aos lugares que deixo, passei na livraria para comprar um livro de exercícios de italiano para praticar no meu retorno ao Brasil e depois fui cumprir um compromisso...
Luiza me havia escrito há alguns dias: “Concordo e partcipo desse seu desejo de ‘não ser turista’, mas gostaria muito que você fizesse uma visita, por mim. É para a Pietá, do Michelangelo, no Museo dell"Opera del Duomo... Grata.” É difícil recusar um pedido da Luiza, e esse, em particular, era impossível recusar. Luiza possivelmente não sabe, mas a Pietá (uma das várias que Michelangelo fez) sempre esteve ligada emocionalmente a uma cena que aconteceu na varanda da casa da própria Luiza. Faz uns 10 anos. Eu estava frustradíssimo após uma temporada de trabalho na Serra da Ibiapaba, e chorei bastante contando a história para Luiza na varanda de sua casa. Luiza, que sempre tem a palavra certa para a hora certa, dessa vez não disse nada. Simplesmente se levantou, caminhou até mim e se curvou, abraçando-me. Se Michelangelo estivesse ali, teria tido vontade de fazer mais uma Pietá, mais uma imagem da Mãe de Jesus acolhendo seu filho exausto.
A tarde foi de correria. Preparei um pacote de 7 quilos, com coisas que não me seriam mais úteis durante o restante da viagem – livros, revistas, guias, meias, cuecas, cabos... – para enviar pelos correios. Depois fiz um bucato de roupa e levei pra lavar na Wash&Dry. Quando voltava para casa, um saco em cada mão, encontrei com o sol, que começava a se pôr. A Via Pisana dava direto para o pôr-do-sol. E, mesmo cansado da correria, me veio a idéia de assistir ao entardecer do Piazzello Michelangelo. Peguei o 12, que serpenteou o monte, entre árvores, até o topo. Saí do ônibus e o sol já era posto. Eu estava no crepúsculo ou, como diz Fabiano, no “encontro do claro com o escuro”. O céu continuava aberto, com uma ou outra nuvem. E foi quando pisei na calçada mais à direita do Piazzello Michelangelo que aconteceu. Foi quando eu soube que os meteorologistas estavam certos. Foi quando eu percebi que todas as nuvens cinzas que deveriam estar no céu estavam, na verdade, em meu peito. Foi quando lembrei das nuvens que já haviam chovido dos olhos de Barbara e Ilona. E foi quando também meus olhos choveram a chuva que não vem do céu. Chuva com trovões de soluços, que me fez apoiar sobre a mureta para não cair. Chuva para a qual o vento seco da Itália foi, pela primeira vez, um carinho, um afago de Mãe. Chuva igual a essa que chove agora só porque me lembro e escrevo.
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Não peguei o 13, que me levaria mais rápido para casa. Peguei novamente o 12, que ainda circularia toda a cidade antes de me deixar próximo à Via Monte Oliveto. Da flor que é Florença, o 12 foi o Circular. O circuladô de fulô.
E mesmo cansado, mesmo com sono, adiei ao máximo a hora de dormir. Simplesmente porque não queria acordar e ter de partir de Firenze.
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Acordei sem despertador. Para o derradeiro café com Bigi. Dei-lhe um regalo, meu livro A Concha e a Borboleta com a tradução italiana escrita a lápis em cada página. Depois fui ao centro comprar, no camelódromo, uma camisa violeta com o símbolo de Firenze em dourado, para que eu tenha sempre no peito a cor e a imagem desta cidade querida.

Oi, Junoca,
ResponderExcluircurioso como essas chuvas aih de Firenze chegaram facilmente aqui em Belo Horizonte. Mesmo sabendo que voce jah estah em Viareggio, desejo que sua estada sem agradavel e que aproveite o que pode ter de bom por aih. Por fim, a avalicao da sua professora foi de que ela fez a coisa certa em te-lo colocado nessa turma e nesse nivel? Beijos.
Ceíta, tem certas coisas na vida da gente que a gente não consegue nem imaginar como seria se fosse diferente. Acho que nem eu nem Barbara conseguimos imaginar como seria se não tivéssemos convivido quase todo dia por quatro semanas. :)
ResponderExcluirAgora, um oito é um oito, né? Mas eu às vezes me perco em coisas básicas, que são do primeiro nível. Com o tempo, com a prática, com a leitura, com os filmes... vou recuperando. :)